15/02/2008

Rei negro

Não credito esta vontade de escrever sobre a minha Fortaleza e seus habitantes a um momento ou maturidade como escritor... isso não existe para mim. Escrevo porque quase todos que aqui moram não amam esta cidade, sequer percebem que ela existe.
Os súditos passavam e admiravam sua calma eterna. Seus domínios iam da Duque de Caxias à praia de Iracema. Ficava esperando eternamente algo ou alguém, sabe lá se era Deus ou a Morte, sempre estava sentado sob silêncio sepulcral e o mesmo traje monárquico puído era o que tinha por cima do corpo. O vi e imediatamente já me possuíra como ser supremo, uma espécie de mentor que não precisava falar e no fundo dos seus olhos febris toda uma história condoída resvalava para minha alma. A rua barulhenta não atrapalhava seus gestos lentos. A rua barulhenta lhe conferia a áurea de um Buda marginal. Já lhe ofereci cigarros, nada. Soube que perdera o irmão para a correria da cidade de São Paulo, pois fora atropelado na sua frente e tal fato, talvez, transformou-o num Rei. Um Rei sem luxo, um Rei cuja coroa era um enorme amarfanhado de cabelos. A angústia tomou-me de chofre quando deixei de vê-lo pelas ruas de Fortaleza, mas assim como sobre mim ele exerceu um poder de sedução, exercera também sobre muitos outros e por isso é sabido que voltara ao seu leito familiar e está sendo bem tratado... lamentar de forma nenhuma a sua partida e sim festejar que outras pessoas perceberam este Rei negro. Sandro é o seu nome.

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